domingo, 30 de outubro de 2011

5° Exame da OAB Unificado - Questão 68–Caderno Amarelo–Nulidade.

Fiquei feliz em ver que a banca examinadora indicou como resposta correta a nulidade absoluta da sentença de um juiz da justiça comum que decidiu um feito da justiça militar.

Esta é a posição que sustentamos ao lado da Professora Maria Lúcia Karam.

Sendo a jurisdição una, não há que se falar em inexistência, pois presente o pressuposto processual de existencia, consistente no órgão jurisdicional.

Não obstante, aqueles que estudaram pelo respeitável livro da professora Ada Pellegrine Grinover, podem ter marcado como resposta correta a inexistência do ato. Isto porque a referida doutrinadora sustenta que a violação à competência constitucional (competencia de jurisdição ou competência de justiça) gera inexistência do ato.

Apesar de não concordarmos com a posição da preclara professora da USP, entendemos que a resposta estaria esteada em valorosa doutrina.

Com efeito, diante da controvérsia doutrinária sobre o tema, onde para uns se trata de  NULIDADE ABSOLUTA (Nicolitt, André. Manual de Processo Penal, Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 194 e Karam, Maria Lúcia. Competência no Processo Penal, São Paulo, 1998, RT, p. 53. ) e para outros INEXISTÊNCIA DO ATO (Grinover, Ada Pellegrini, As Nulidades no Processo Penal. SP, RT, 2001, p. 51), pensamos ser inadequado o questionamento no âmbito de prova objetiva, vez que pode se chegar a duas respostas doutrinarimente válidas.

Aos candidatos caberá questionar a questão por falta de objetividade na resposta. Mas, repito, fico feliz em perceber que nossa posição prevaleceu no certame.  

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Efetividade do Princípio da Insignificância

Processo nº 2006.014.010112-4
1
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
COMARCA DE CAMPOS
JUIZO DE DIREITO DA PRIMEIRA VARA CRIMINAL
SENTENÇA
Processo nº 2006.014.010112-4
RELATÓRIO
Trata-se de AÇÃO PENAL PÚBLICA proposta pelo Ministério
Público imputando aos réus o crime do art. 155, § 4º, inciso II e IV do CP.
Auto de apreensão às fls. 27/28.
Denúncia recebida às fls. 49.
Laudo de avaliação indireta às fls. 45.
CAC’s às fls. 79/80.
FAC’s às fls. 90/95 e 140/142.
Processo nº 2006.014.010112-4
2
Interrogatórios às fls. 140/142.
Defesa prévia às fls. 109.
Laudo de exame de local às fls. 87/88.
Desmembramento do feito em relação à ré Marilza às fls. 117.
Oitiva das testemunhas de acusação às fls. 136/138.
Alegações finais do MP às fls. 145.
Alegações finais da defesa às fls. 152.
É o relatório. Passo a decidir.
FUNDAMENTAÇÃO
Trata-se de ação penal na qual o Ministério Público imputa aos três
acusados Diego, Marilza e Ângela Maria, a prática de furto qualificado pelo
abuso de confiança e concurso de pessoa.
Capítulo I – A acusação
Segundo a denúncia, Diego, Marilza e Ângela, no dia 05 de abril (se
fosse primeiro eu pensaria que era mentira), subtraíram no interior da
Pastelaria Il Mestre os seguintes bens: 07 quilos de apresuntado Frimesa (nem
era presunto Sadia); cinco quilos de mussarela, cinco quilos de carne moída
(não era filé mignon), 03 tomates, dois limões e duas cabeças de alho.
Processo nº 2006.014.010112-4
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Capítulo II – Do Processo
Trata-se de processo de Meta 2 do CNJ, ou seja, o Estado mantém em
trâmite a presente acusação por mais de 04 anos. O volume único conta com
161 folhas de dinheiro público e esforço da máquina judicial em dar resposta
às intermináveis demandas que lhe são ofertadas.
Capítulo III – Das Perplexidades e Reflexões
Ao me deparar com o presente feito uma primeira indagação me
acudiu. O que ocorre com tudo aquilo que estudamos, um montão de
conhecimentos teóricos, que nos são exigidos para passar nos concursos
jurídicos?
Para onde foi ou onde estão guardados os conhecimentos sobre temas
como “furto famélico”, “princípio da bagatela” ou “insignificância”, distinção
entre “tipicidade formal e “tipicidade material”, “tipicidade conglobante de
Zaffaroni”, a jurisprudência do STF e etc.?
Mas esquecer todos estes princípios e teorias, poderia até ser. Mas se
não soubermos mais distinguir entre tentativa e consumação, onde iremos
parar?
Segundo os autos (fls. 137), o proprietário chegou inusitadamente no
estabelecimento e encontrou próximo ao local onde são confeccionados os
alimentos, os produtos em um saco preto, preparados para serem subtraídos.
Nenhum produto saiu do estabelecimento e todos foram encontrados pelo
proprietário no momento em que seriam jogados na lixeira, ou seja, nada mais
ilustra uma tentativa senão isso.
Processo nº 2006.014.010112-4
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Não obstante, a acusação e as alegações finais, sustentam furto
consumado.
Capítulo IV – O porquê?
Durante muito tempo acreditei processos como estes pudessem ser
fruto de desconhecimento ou falta de sensibilidade social.
Mas, quando me deparo com alunos de graduação que conhecem com
firmeza todos os princípios acima referidos, bem como distinguem com
maestria (e mesmo sem ler um dos melhores livros sobre o tema “Da
Tentativa”, do Zaffaroni) a distinção entre consumação e tentativa, concluo
que o conhecimento não é perdido. Talvez fique guardado em algum lugar
para beneficiar alguém que tenha visibilidade social (e não fazemos aqui
apologia ao que Karam chama de esquerda punitiva), algum réu bem letrado,
com dinheiro ou cargo importante, cujos atos passam por uma lente que os
tornam menos acintosos, portanto, menos reprováveis. Algum acusado que
não seja uma simples vida nua como descreve Agamben.
Talvez para isso estes princípios estejam guardados em algum lugar de
nossa mente ou de nosso coração.
Deixei de acreditar no desconhecimento e então encontrei a resposta...
Capítulo V – A verdadeira Função do Sistema Penal
Não é desconhecimento. Afinal, estamos no mundo jurídico. Somos
todos Bacharéis, Excelências, Ilustríssimos, dentre outras honrarias e não
fazemos parte do que um antigo professor que tive descrevia como “plebe
rude e ignara”.
Processo nº 2006.014.010112-4
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Na verdade a questão é ideológica. Cumpre-se uma função, não
revelada, do direito penal ou do sistema penal para sermos mais amplos. Na
medida em que assim agimos, nos desviamos das funções declaradas do direito
(dignificar o homem, igualar o homem [justiça aristotélica], libertar o homem
[justiça Kantiana] e quanto ao direito penal, a função declarara de limitar o
poder punitivo estatal), para realizarmos a função oculta do direito penal, bem
traduzida por Löic Wacquant, qual seja, PUNIR OS POBRES.
Wacquant, em sua obra, demonstra como o encarceramento é a forma
de gestão da miséria nos Estados Unidos, o que não é diferente no Brasil,
como demonstra o Conselho Nacional de Justiça - ao divulgar o perfil dos
presos (60% negros e partos) - e o Ministério da Justiça, destacadamente
quando constata que 67% dos presos não possuem o primeiro grau e 8% são
analfabetos (em resumo 75% são analfabetos).
A criminalização e o encarceramento da pobreza é uma ordem mundial
globalizada.
Com efeito, quando o Estado, através de seus “agentes políticos”
produzem processos como o presente, cumpre a função ideológica e não
revelada do sistema penal, e assim se formam as estatísticas, MEIO MILHÃO
DE PRESOS NO BRASIL. E sobre isso, a melhor lição é de Caetano:
... E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo
Diante da chacina
111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os
pretos
E quando você for dar uma volta no Caribe...
Processo nº 2006.014.010112-4
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Capítulo VI – O resgate da Junção Jurisdicional
Para Owen Fiss: the function of a judge is to give concrete meaning and
application to our constitutional values1 (a jurisdição tem por função atribuir
significado e aplicação aos valores constitucionais)2.
Os direitos fundamentais, a dignificação, libertação e igualização do
homem estão na centralidade da função jurisdicional, o que ao menos em
algumas luminosas passagens, tem ocorrido, vale transcrever:
O STF inúmeras vezes assinalou que:
Para a aplicação do princípio da insignificância, é necessária, na
aferição do relevo material da tipicidade penal, a inequívoca
constatação de seus vetores, que são (a) a mínima ofensividade da
conduta do agente, (b) a ausência de periculosidade social da ação, (c)
o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a
inexpressividade da lesão jurídica provocada (HC 90747).
E mais:
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ORDEM CONCEDIDA.
Conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal (HC 92.438, de
minha relatoria), impõe-se a rejeição da denúncia ou o trancamento da
ação penal, por falta de justa causa, quando o valor do tributo devido
pelo acusado de descaminho for inferior ao montante mínimo
legalmente previsto para a execução fiscal (art. 20 da Lei 10.522/2002,
na redação dada pela Lei 11.033/2004), uma vez que não faz sentido
que uma conduta administrativa ou civilmente irrelevante possa ter
relevância criminal. Ordem concedida para reconhecer a atipicidade
material da conduta atribuída ao paciente (HC 96307).
O STJ tem adotado a mesma linha ao decidir:
1 FISS, Owen. The forms of justice. Harvard Law Review, Cambridge, Harvard University Press, v.93, p. 04.
2 No Brasil temos a lição de: MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. São Paulo: RT, 2006, p.
105.
Processo nº 2006.014.010112-4
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PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO. RECEBIMENTO DA
DENÚNCIA. DESPACHO. POSTERIOR RETRATAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL.
TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO.
INEXPRESSIVA LESÃO AO BEM JURÍDICO TUTELADO.
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ORDEM
DENEGADA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de
que, recebida a denúncia, "não é legítima a sua posterior retratação,
pelo Juízo processante, do despacho que inicialmente acolheu a
acusação" (HC 86.903/DF). 2. O princípio da insignificância surge
como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de
acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas
em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas,
primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no
sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma
penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da
intervenção mínima. 3. Indiscutível a sua relevância, na medida em
que exclui da incidência da norma penal aquelas condutas cujo
desvalor da ação e/ou do resultado (dependendo do tipo de injusto a
ser considerado) impliquem uma ínfima afetação ao bem jurídico. 4. A
subtração da quantia de R$ 20,00, no interior do bolso da roupa da
vítima, embora se amolde à definição jurídica do crime de furto, não
ultrapassa o exame da tipicidade material, mostrando-se
desproporcional a imposição de pena privativa de liberdade, uma vez
que a ofensividade da conduta se mostrou mínima; não houve
nenhuma periculosidade social da ação; a reprovabilidade do
comportamento foi de grau reduzidíssimo e a lesão ao bem jurídico se
revelou inexpressiva. 5. Ordem denegada. Habeas corpus concedido, de
ofício, para determinar a extinção da ação penal instaurada contra o
paciente. (HC 115.865)
STJ – Habeas Corpus 62417 – SP – Ministro Gilson Dipp.
CRIMINAL. HC. FURTO QUALIFICADO. PLEITO DE
ABSOLVIÇÃO. ÍNFIMO VALOR DOS BENS SUBTRAÍDOS
PELA AGENTE. INCONVENIÊNCIA DE
MOVIMENTAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. DELITO DE
BAGATELA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. FURTO
FAMÉLICO. ORDEM CONCEDIDA.
Processo nº 2006.014.010112-4
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I. Hipótese em que o impetrante sustenta que a conduta da ré não
se subsume ao tipo do art. 155 do Estatuto Repressor, em face do
pequeno valor econômico das mercadorias por ela subtraídos,
atraindo a incidência do princípio da insignificância.
II. Embora a impetração não tenha sido instruída com o referido
laudo de avaliação das mercadorias, verifica-se que mesmo que a
paciente tivesse obtido êxito na tentativa de furtar os bens, tal
conduta não teria afetado de forma relevante o patrimônio das
vítimas.
III. Atipicidade da conduta que merece ser reconhecida a fim de
impedir que a paciente sofra os efeitos nocivos do processo penal,
assim como em face da inconveniência de se movimentar o Poder
Judiciário para solucionar tal lide.
IV. As circunstâncias de caráter pessoal, tais como reincidência e
maus antecedentes, não devem impedir a aplicação do princípio da
insignificância, pois este está diretamente ligado ao bem jurídico
tutelado, que na espécie, devido ao seu pequeno valor econômico,
está excluído do campo de incidência do direito penal.
V. A res furtiva considerada - alimentos e fraldas descartáveis-,
caracteriza a hipótese de furto famélico.
VI. Deve ser concedida a ordem para anular a decisão condenatória
e trancar a ação penal por falta de justa causa.
VII. Ordem concedida, no termos do voto do Relator.
Como não poderia deixar de ser, O Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro, através da luminosa pena do Des. Geraldo Prado, asseverou:
DIREITO E PROCESSO PENAL. TENTATIVA DE FURTO DE
DEZ LATAS DE AZEITE NO INTERIOR DE UM SUPERMERCADO.
PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO PENAL
MÍNIMA E DA INSIGNIFICÂNCIA. PEQUENO VALOR DA COISA
QUASE SUBTRAÍDA E RUDIMENTAR MODO DE EXECUÇÃO DA
CONDUTA A DENOTAR A FALTA DE OFENSIVIDADE DO
COMPORTAMENTO. IRRELEVÂNCIA DA LESÃO AO BEM JURÍDICO
PROTEGIDO. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. (Apelação Criminal n° 0042748-
98.2007.8.19.0001, 5ª Câmara Criminal – TJRJ – Rel. Des. Geraldo Prado)
Processo nº 2006.014.010112-4
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Como supedâneo para o trilhar seguro do Judiciário em busca da
dignificação do homem, principalmente dos que precariamente lutam pelo
mínimo existencial (Canotilho), encontramos a lição de inúmeros pensadores e
juristas.
A doutrina abalizada vem reconhecendo a fragmentariedade do direito
penal. Para Figueiredo Dias, a função do direito penal radica na proteção das
condições indispensáveis da vida comunitária. Desta forma, só deve incidir
sobre os comportamentos ilícitos que sejam dignos de uma sanção de natureza
criminal3. Nilo Batista4 nos da conta de que Binding foi o primeiro a registrar,
em seu Tratado de Direito Penal, em 1896, o caráter fragmentário do Direito
Penal. O direito penal deve pautar-se, então, por uma intervenção mínima,
como ultima ratio.
Neste contexto, destaca-se o princípio da insignificância como causa
excludente da tipicidade. Como ensina Zaffaroni, as afetações a bens jurídicos
exigem certa gravidade, não sendo qualquer conduta capaz de preencher as
exigências da tipicidade penal5. O princípio da insignificância foi impresso pela
primeira vez por Claus Roxin em 1964 e é tratado por Tiedemann como
princípio da bagatela, segundo o qual deve haver uma proporcionalidade entre
a gravidade da conduta que se quer punir e a “drasticidade da intervenção
estatal”6.
A tipicidade, atualmente, não é vista simplesmente como a adequação
ou subsunção entre a conduta e a descrição legal de um crime, o que seria a
3 DIAS, Jorge de Figueiredo. Direitos Penal Parte Geral Tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 16.
4 BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, s/d, p. 84-90.
5 ZAFFARONI, Eugenio Raul. Manual de Derecho Penal Parte General. Buenos Aires: Ediar, 1999, p. 475.
6 BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 20-21.
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tipicidade formal. Na verdade, a tipicidade exige efetiva e grave lesão ao bem
jurídico tutelado pela norma, isto é, tipicidade material.
Voltando a Zaffaroni, temos que o juízo sobre a tipicidade não se
esgota na tipicidade legal, exigindo um passo a mais, que é a comprovação da
tipicidade conglobante, isto é, um corretivo da tipicidade legal, que exclui
condutas que são apenas “aparentemente” proibidas. Com efeito, a
insignificância da afetação exclui a tipicidade, pois esta só pode se constituir
através da consideração conglobada da norma7. Em síntese, não será toda
conduta que se amolde a um tipo penal que permitirá a formação de um juízo
de tipicidade, mas tão somente aquelas que se traduzirem em uma grave lesão
ao bem jurídico tutelado.
Por certo, por certo o caso dos autos está longe de caracterizar grave
lesão ao bem jurídico tutelado.
Ângela Maria, em seu interrogatório, confessa que quando seu
empregador mandava jogar fora produtos com a validade vencida, costumava
levar tais produtos para casa (fls. 105). Este é o povo brasileiro que por
necessidade, às vezes é levado a comer lixo.
Diego confessa que subtraiam os produtos, dividiam para os três e os
consumiam (fls. 104). Nada mais famélico ou insignificante.
Com efeito, creio que já me alonguei em demasia por dois limões, duas
cabeças de alho, três tomates e um pouco de carne moída, quando bastava
dizer: trata-se de fato atípico.
7 ZAFFARONI, Manual...op. cit., p. 386 e 475.
Processo nº 2006.014.010112-4
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Capitulo VII – FINAL
Isto posto, JULGO IMPROCEDENTE A PRETENSÃO
PUNITIVA ESTATAL, absolvo os réus DIEGO e ANGELA MARIA, das
imputações pelo crime do art. 155, §4º, II e IV do CP, ex vi, art. 386, III do
CPP.
Sem custas.
Anote-se e comunique-se.
P.R.I. Após o trânsito, dê-se baixa e arquivem-se.
Campos, 10 de Dezembro de 2010.
ANDRÉ LUIZ NICOLITT
Juiz de Direito

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Processo Penal Cautelar e Análise Econômica do Direito–Alexandre Morais da Rosa

No curso de aperfeiçoamento dos magistrados promovidos pela EMERJ, o Prof. Alexandre Morais da Rosa proferiu brilhante palestra (18/07/11) na qual destacou as razões ocultas da reforma que ampliou as formas de controle social diminuindo o âmbito de incidência da prisão processual, muito menos por razões humanistas e mais por razões econômicas, constatando que o custo do controle é menor que o custo da prisão.

Para além da análise crítica, dicorreu sobre aspectos práticos relevantes, como a aplicação da detração e os prazos para o encaminhamento do auto de prisão em flagrante e para o oferecimento da denúncia, temas que provocam muitas dúvidas.

O evento foi marcado por calorosos debates do que saiu fortalecida a democracia.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Seminário–Emerj - Novo Regime das Cautelares no Processo Penal

Seminário sobre O Novo Regime das Cautelares - Emerj - 04/07

No dia 04/07/2011, entrou em vigor a Lei 12.403/11. Nesta data a EMERJ reuniu em um seminário vários professores e operadores do direito para discutir a nova lei. O debate profuso e aquecido por uma assistência atenta, interessada e qualificada, com perguntas enriquecedoras, permitiu grande reflexão a todos.

Além da nossa palestra, tivemos as falas de: Gustavo Badaró, Denis Sampaio, Fernando Vila Pouca, Eugenio Pacelli, Paulo Rangel, Marcos Peixoto.

Do quadro geral, parece ter sido unânime o entendimento de que não existe “poder geral de cautela” na esfera do processo penal, de forma que as únicas medidas cautelares cabíveis são as previstas na Lei 12.403/11.

De nossa parte, sustentamos a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos:

  • Art. 282 § 2 e art. 311 do CPP – medidas cautelares de oficio pelo juiz – violação do sistema acusatório.
  • Art. 282, I parte final e 319, VI, 312 do CPP- violação da presunção de inocência. (para evitar a prática de infrações penais e garantia da ordem pública, ou da ordem econômica). Transforma a aplicação das medidas em antecipação da pena, uma vez que, o controle social, a prevenção geral e específica, são funções da pena segundo as teorias relativas da pena.
  • art. 313, III do CPP - inconstitucionalidade da reincidência – ne bis in idem.

Denis Sampaio destacou:

A lei veio para romper paradigmas. Sempre vivenciamos o processo penal emergencial. As leis repressivas não mudaram a criminalidade. O que temos que ter é uma expressão social da sociedade. Essa lei vem com o foco principal de minimização do cárcere. A prisão minimiza erros e isso se torna sensível. Se o delegado prende, o juiz decreta prisão a mídia não critica. Vivemos em uma sociedade de risco, onde temos punição mediática. Temos a necessidade de mudança de paradigma, não adianta mudar a lei, devemos que mudar a cultura. Hoje a superpopulação do cárcere mostra a necessidade de mudança de paradigma.

O Professor Badaró destacou o caráter alternativo das medidas cautelares e não substitutivos, afirmando ainda não ser possível cumulação de prisão preventiva com outra medida. Ademais, destacou a incidência do princípio da proporcionalidade.

O Delegado de Polícia Fernado Vila afirmou que, ao contrário do que se pensa, a inclusão do contraditório nas medidas cautelares é algo saudável, inclusive para a investigação da verdade.

O Professor Pacelli destacou a importância da proporcionalidade: “Prisão é violência e violência produz danos. Logo, deve-se aplicá-la quando os danos a serem protegidos sejam mais graves do que os gerados pela prisão” e, ainda, criticou a terminologia “liberdade provisória” cuja origem reside nos tempos quando ainda vigorava a “presunção de culpa”. Por fim, advogou a inconveniência da admissão de habeas corpus para impugnar medidas cautelares diversas da prisão.

 Paulo Rangel foi categórico ao afirmar que o não houve alteração no prazo do inquérito e que o magistrado só irá decidir pela conversão do flagrante em preventiva ao receber o este instruindo a denúncia.

Esse foi o ponto alto da polêmica, vez que a maioria dos palestrantes assim não entendeu. A nosso ver, trata-se de interpretação retrospectiva que olha o novo com a visão do velho e faz com que a nova lei nada mude. Note-se, inclusive, que a própria literalidade dos artigos não autorizam a interpretação proposta pelo preclaro amigo e doutrinador:

“Art. 306.  A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. 

§ 1o  Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública”.

Ou seja, em 24 horas será encaminhado o auto de prisão em flagrante e o juiz:

“Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: 

I - relaxar a prisão ilegal; ou 

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou 

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.”

O dispositivo não deixa dúvida que, tão logo (24 horas) o juiz receba o auto de prisão, deverá decidir sobre o relaxamento, conversão em preventiva ou concessão da liberdade.

Algumas perguntas da platéia mereceram destaque:

A Lei 12.403/11 revogou parcialmente a Lei da Prisão Temporária, não sendo cabível mais para delitos como o sequestro, cuja pena é de 03 anos?

1) A nosso sentir, na medida em que só cabe prisão preventiva para crimes cuja pena seja superior a 04 anos, à luz da proporcionalidade trazida pela Lei 12.403/11, as hipóteses de cabimento da prisão temporária sofreram impacto, de forma que, não é cabível prisão temporária em crimes como o sequestro ou cárcere privado.

2) Pode o Delegado de Polícia aplicar fiança quando os crimes tiverem pena máxima de 04 anos e há concurso de crimes, como dois furtos ou um furto e um estelionato?

Tanto o professor Pacelli, como por nós, foi manifestado a necessidade de maior reflexão sobre o tema. De nossa parte, prometemos externar posição aqui no blog, embora já antecipemos a simpatia pela ideia de aplicar o mesmo critério da prescrição (individual global).

Conclusão: muita coisa pra pensar.

sábado, 2 de julho de 2011

O Novo Processo Penal Cautelar–Lei 12.403/11

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Estimulado pela reforma no processo penal introduzida pela Lei 12.403/11, apresentamos ao leitor, não apenas uma análise sobre o novo regime da Prisão Processual e das Novas Medidas Cautelares, mas também dedicamos um capítulo sobre o que chama medidas cautelares probatórias e medidas cautelares reais, no qual tratamos de temas como busca e apreensão, interceptação telefônica, captação e interceptação ambientais, ação controlada e agentes infiltrados. Com isso, o leitor terá em uma só obra, o que pode se chamar de “Processo Penal Cautelar”. 
LANÇAMENTO: Dia 23 de Agosto - Auditório da Emerj - 18:30horas.



NOTA DO AUTOR
Enquanto tramita no Congresso Nacional e se debate em todo país o projeto de um novo código de processo penal (PL 156/2009), somos surpreendidos por mais uma reforma pontual no CPP e reformas desta natureza são sempre motivos de preocupação.
Precisamente em relação à reforma trazida pela Lei 12.403/11, dois pontos reclamam atenção, a saber: a seara sensível na qual incide, ou seja, a constrição sumária da liberdade individual, fundada em juízos provisórios; e a implantação superficial das pretensões contidas no PL 156/2009.
Não obstante, a ampliação do rol das cautelares, cunhando com maior nitidez a natureza excepcional da prisão, medida que deve, portanto, funcionar como ultima ratio, é algo a ser festejado. Agora, o juiz não fica mais escravo da prisão provisória, podendo lançar mão de inúmeras medidas em substituição a ela. Este talvez seja o pondo mais relevante da reforma.
Com efeito, imperioso que os atores do processo penal tenham consciência de que as novas medidas cautelares trazidas pela Lei 12.403/11 surgiram para funcionar como instrumento de liberdade, evitando a prisão, e que nos cabe não transformá-las em instrumento de expansão do controle e do poder punitivo estatal.
Esta foi a diretriz interpretativa que nos guiou na análise dos institutos da Lei 12.403/11. Ademais, buscamos, também, suprir a falta legislativa de não reunir o sistema cautelar penal, tratando tudo de forma esparsa. Por tal razão, buscamos no presente tratar das três espécies de medidas cautelares do processo penal, ou seja, as cautelares pessoais, as cautelares reais e as cautelares probatórias.
Niterói, 02/07/2011.